domingo, dezembro 04, 2005

O Valor de Um Fracasso

O que nós chamamos de fracasso, de derrota? O que é perder, o que é não atingir um objetivo?

Fracasso é fracasso, você tentou algo e falhou miseravelmente. Derrota idem, associe essa palavra a "perdedor" e terá uma explicação muito boa em termos de competição. Pelo menos, se relevarmos o que a sociedade como um todo nos mostra.

O que é perder? Para entendermo isso, primeiro vamos entender o que é o inverso, ou pelo menos poderia ser considerado como o inverso, "ganhar".

Ganha-se dinheiro - menos do que esperamos - mas também ganhamos problemas. Você pode ganhar felicidade, mas pode ganhar muita tristeza. Ganhar tem um sentido amplo, seja para o positivo quanto para o negativo, afinal, quem nunca aqui ganhou um elefante cor-de-rosa? Pela lógica do sentido que dá-se a perda, "ganhar" deveria estar relacionado a algo bom, algo maravilhoso, mas como qualquer um provavelmente já teve a chance de comprovar, ambigüidade e ironia são uma das peças chaves que fazem a vida ter graça.

Voltemos ao "perder". Perde-se dinheiro - muito mais do que conseguimos ganhar, fato comprovado por cientistas, estudiosas da economia e empresas de cartão de crédito - perde-se a oportunidades, eventos e situações. Perdemos a chance de ficarmos calados, assim como perdemos o ônibus pela manhã - comparação impressionante.

Mas nem só de tristezas e desilusões são as coisas qeu envolvem o "perder". Perdemos muito mais durante o dia do que somos apazes de nos dar conta, e mesmo assim não ficamos reclamando, afinal, não nos damos conta! Perdemos a noção da hora quando estamos fazendo algo incrivelmente interessante - ou, pelo menos, que seja capaz de prender nossa atenção.- perdemos a conta do quão importante um segundo pode vir a ser para cada um de nós. Perdemos o nascer do sol, mas não sentimos vontade de por um fim a nossas vidas por causa disso.

Inevitavelmente, dia-após-dia perdemos alguma oportunidade, por menor que ela seja. Perdemos a de ficar calados - já citada e essencial a nossa sobrevivência pelo nosso tempo de existência - perdemos a fatalidade que quase nos atinge, seja pelo carro que quase nos atropela, trazendo para outros o destino que provavelmente nos era devido, assim como perdemos a maravilha de tudo o que ocorre ao nosso redor, que independente de quanta atenção nós damos, ainda assim, não deixa de acontecer. Perdemos o sorriso daqeuele que espera alguém para recebê-lo, assim como perdemos a simplicidade de um "bom dia", expressão intima e pessoal de cada um, o qual acaba sendo compartilhado com todo o mundo que resolve "perder" um pouco do seu tempo para ouvi-lo.





O que é o fracasso, além do objetivo não atingido, da nota perfeita não conseguida, do segundo lugar conquistado, do sonho despedaçado?

Algum dia daremos mais valor ao fracasso, e entenderemos que ele não é sinônimo de perda, tampouco ambos significam o fim da linha. Algum dia, quando cada um assim o puder, vamos entender que "perder" também é "ganhar", e será nesse dia que entenderemos que, diferente de tudo o que acabamos aprendendo na escola - da vida - a vida nao se resume a perder e a ganhar, tampouco é uma competição.

Pois diferente de um "falhei miseravelmente", o fracasso pode significar um "eu não consegui", dando-nos tempo para pensar, refletir, agir e planejar melhor o que passamos e o que faremos dai por diante. Pois é o fracasso que nos coloca em prova, nos mostra onde erramos, onde pecamos e, o mais importante, onde melhoramos.

Perder de vez em quando é bom. Faz com que a vida não seja tremendamente monótona, tomada por uma sequência de atos e fatos previsiveis a cada esquina, sem surpresa nenhuma além daquilo que não conhecemos.

Perder... há a crença de que a perda é algo que não deu certo, que é o trabalho perdido, o tempo desperdiçado, o objetivo não alcançado. De que batalhamos arduamente por por algo que não foi finalizado, o sonho amado não concluido, o futuro, despedaçado.

Engana-se quem pensa assim. O mundo é uma sequência não de perdas e ganhos, mas de uma eterna troca, na qual você oferece algo para receber uma coisa de igual valor. Minto, não uma coisa, mas o equivalente de igual valor. Um estudante que se dedica até o limite para passar em um concurso, paga o preço do esforço e do sacrificio, abdicando de horas de sono e minutos de diversão, odiando sua existência ao constatar que mesmo assim não passou e que o seu tempo, desperdiçou. Mas em sua essência de só enxergar o que perdeu, não percebe que, de igual forma, algo ganhou. Que as noites sem dormir não foram em vão e que o conhecimento adquirido, a duras penas, a experiência atravessada, o fortalecimento da alma, permanece.

Por meros segundos um atleta perde o primeiro lugar, mas em troca, ganha a satisfação pessoal de ter tentado, competido e seu recorde particular, ultrapassado. Por poucos reais o vendedor perde a licitação mas, vivo e otimista, sai de dentro da sala, animado pela batalha contra os leões.

Por mais óbvia que seja a derrota, o soldado vai a batalha, defende a bandeira, honra a nação, protege a familia, luta ao lado do irmão. Perde a batalha, conhece a derrota mas, seu dever para com os outros, não abandona, não.

Não é um mundo só de perdas e ganhos, mas também de trocas justas, muitas das quais não percebemos, tampouco conseguimos enxergar. Pois o mundo só enxerga a perda, a derrota, o fracasso e a aflição. Não enxerga que as vezes, é preciso perder hoje, para amanhã encontrar a solução.

Até o dia em que finalmente conseguirmos enxergar, viermos a aprender que fracassar não é o fim da linha, tampouco a destruição da razão. É o começo da crise, uma nova missão, a abertura para novos caminhos, quando temos uma nova visão - se formos capazes de amadurecer a tal ponto - que nos leva a novos rumos, novas oportunidades.

Perder é bom. Nos mostra o erro, onde falhamos, onde melhorar. Aponta o caminho que longe de ser errado, não era o "tão ideal" que assim enxergavamos. Abre nossos olhos para o que devemos relevar, quebra nosso orgulho em não admitir falhas que poderiam ser evitadas se admitissemos que não somos perfeitos demais para... errar.